terça-feira, 13 de junho de 2017

O negócio André Silva



O Porto anunciou ontem a venda de André Silva ao Milan por 38 milhões de euros, com mais 2 milhões em variáveis. São valores muito interessantes para o clube: André Silva é um ponta-de-lança jovem, com muito potencial, presença assídua na seleção nacional no último ano com vários golos marcados, mas, ainda assim, não nos podemos esquecer de que realizou uma segunda metade de época sofrível.

Segundo o jornal O Jogo, o Porto tem 100% dos direitos económicos do jogador, o que, à partida, pressuporia mais-valias financeiras elevadíssimas para a SAD portista - como é um jogador da formação, para determinarmos a mais-valia, basta retirar a comissão de intermediação dos 38 milhões e os gastos com as duas renovações que existiram desde 2014.


No entanto, a história não é assim tão simples. Em primeiro lugar, o facto de tudo indicar que é mais uma venda do carrossel levanta a questão de quanto deste dinheiro circulará realmente entre clubes. A saída do ponta-de-lança não surpreende ninguém, pois já desde o início da época se dizia que a venda de André Silva já estava definida, por valores a rondar os 40 milhões (ou deveremos dizer mendilhões?). O único aspeto em que não se acertou foi o destino, que era, supostamente, outro: o Atlético Madrid. Havia vários sinais que fortaleciam esta hipótese: à boa maneira do carrossel, o Atlético enviou Oliver Torres para o Porto com uma opção de compra (que entretanto foi acionada) também considerável: 20 milhões. O problema é que a FIFA proibiu o clube espanhol de inscrever jogadores, pelo que foi necessário encontrar outro destino. 

Para além disto, ainda há a questão dos direitos económicos. Em 2014, a pouco mais de 6 meses do final do contrato, o Porto e André Silva chegaram a acordo para renovar a ligação. Apesar de ser um jogador que, na altura, nunca tinha jogado pela equipa principal, o acordo acabou por não sair barato para o clube. Há cerca de um ano, o Football Leaks revelou o contrato de intermediação da renovação assinado entre o Porto e António Teixeira da Silva, na qualidade de agente do jogador, onde estão incluídas as seguintes compensações pelos serviços prestados:
  • Um pagamento de 100.000€ assim que o jogador completasse 10 partidas pela equipa principal;
  • Atribuição de 10% dos direitos económicos de André Silva ao agente;
  • Atribuição de 10% das mais-valias de uma futura transferência de André Silva.






Pelo texto do contrato, dá a ideia de que o agente ficaria com direito a 10% do valor da transferência (via direitos económicos) e, adicionalmente, com 10% das mais-valias registadas pelo clube após deduzidas as várias despesas da venda e da renovação.

A informação constante neste contrato entra em colisão com a indicação que O Jogo adiantou sobre o Porto ser detentor de 100% dos direitos económicos. Nos últimos R&C's da SAD não encontrei nenhuma informação sobre a percentagem de passe de André Silva que pertencia ao Porto. A CMVM deveria pedir esclarecimentos sobre isto.

Entretanto, em 2016, André Silva passou a ser representado por Jorge Mendes e voltou a renovar com o Porto. Não me apercebi, na altura, de notícias que dessem conta de que o Porto tivesse recuperado os direitos cedidos ao agente aquando da renovação de 2014. Se as condições do contrato mostrado acima ainda forem válidos, e considerando ainda que a transferência para o Milan foi coordenada por Jorge Mendes, então falamos de 3 grandes tranches que não entrarão nos cofres do Porto: os habituais 10% de intermediação do super-agente, os 10% dos direitos económicos e os 10% de mais-valias. Tudo junto, falamos de um pouco menos de 30% do bolo total.

Para além disso, há o problema adicional do carrossel de que poucos falam: os benefícios contabilísticos são imediatos, mas deixa um rasto de custos que aumentará a dependência de negócios destes nos anos que se seguirão.

Independentemente disso, é uma transferência que deixará os responsáveis portistas um pouco mais aliviados, pois é sabido que têm até ao final do mês para realizar vendas que permitam reduzir os prejuízos até 30 milhões. O recente acordo com a UEFA no âmbito do Fair Play Financeiro a isso obriga.